A inflação dos alimentos levou 58% dos brasileiros a diminuírem a quantidade de comida comprada, segundo pesquisa Datafolha divulgada neste domingo (14). A situação é ainda mais grave entre os mais pobres: 67% das pessoas com renda menor precisaram cortar alimentos do carrinho.
A alta de preços já impôs algum tipo de mudança de hábito para 8 em cada 10 brasileiros. Entre as estratégias mais adotadas estão sair menos para comer fora (61%), trocar marcas de café por opções mais baratas (50%) e reduzir o consumo da bebida (49%). “A comida está pesando demais no bolso. A gente corta o que pode, mas tem hora que não tem mais de onde tirar”, disse uma entrevistada em São Paulo.
A percepção da população é clara: para 54%, o governo Lula tem muita responsabilidade pelo aumento dos preços. Outros 29% veem alguma culpa. Apenas 14% isentam o Planalto. Mesmo entre eleitores de Lula, 72% reconhecem que ele tem total ou parcial responsabilidade pela disparada da inflação.
A pesquisa foi realizada com 3.054 pessoas em 172 municípios entre os dias 1º e 3 de abril, com margem de erro de dois pontos percentuais.
O peso no bolso levou os brasileiros a cortarem também nos gastos essenciais. Metade da população afirma ter reduzido o consumo de água, luz e gás. Buscar uma segunda fonte de renda virou realidade para 47% dos entrevistados. Outros 36% reduziram o consumo de remédios, 32% deixaram de pagar dívidas e 26% atrasaram contas de casa.
A crise alimentar aparece também na mesa: 1 em cada 4 brasileiros diz ter menos comida do que o suficiente em casa. Apenas 13% afirmam ter mais do que o necessário, e 60% relatam quantidade apenas suficiente — sem melhora em relação ao início do governo.
Mesmo com a tentativa do presidente de estancar a sangria nos supermercados, como a isenção de imposto de importação em alguns produtos, o impacto até agora é nulo para a população, segundo avaliação de especialistas. Os efeitos não chegaram à ponta — e os preços seguem subindo.
O Datafolha mostra ainda que 55% dos brasileiros dizem que a economia piorou nos últimos meses — maior índice desde o início do terceiro mandato de Lula. É a primeira vez que a percepção negativa supera a marca de 50% neste governo.
O aumento do custo de vida não é só impressão. Dados do IBGE confirmam: a inflação acumulada em 12 meses até março foi de 5,48%, com alta de 1,17% só na alimentação. Produtos como tomate (22,55%), ovos (13,13%) e café moído (8,14%) puxaram os preços. Em 12 meses, o café acumula alta de 77,78%.
O impacto se explica por safras frustradas, calor excessivo, exportações pressionadas e aumento de demanda. A instabilidade no fornecimento mundial de alimentos se somou à inoperância da política econômica, dizem analistas. “O governo continua tentando empurrar com a barriga uma inflação que exige mais do que discurso”, avalia Cláudio Dantas, jornalista político.
Ao atribuir causas para a alta, os entrevistados também citaram a crise climática, as guerras no mundo, os produtores rurais e a crise nos EUA, mas o governo Lula apareceu sempre como o maior responsável — em todos os recortes sociais.
Apenas entre os mais pobres, os produtores rurais dividem o protagonismo: 55% apontam Lula como principal responsável e 54% culpam o agronegócio. Entre os mais ricos, a responsabilidade do Planalto ainda é alta (41%), mas o peso das outras causas diminui.
Eleitores de Zema e Tarcísio de Freitas lideram a cobrança: 78% e 77% respectivamente atribuem ao governo a culpa pelos preços abusivos. Já entre os lulistas, a guerra e os ruralistas são os vilões preferenciais, com 57% e 55% das menções, respectivamente.
Apesar disso, o presidente tenta manter a narrativa de que a economia está “melhorando”. A avaliação positiva do governo subiu levemente de 24% para 29%, mas ainda está bem abaixo da reprovação, que chega a 38%. No bolso, a conta não fecha.