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Brasília

Dura e triste realidade

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Por César Dario Mariano da Silva*

Se for realizada uma pesquisa séria sobre a maior preocupação da população, tenho quase certeza de que será a segurança pública.

Dificilmente alguém não foi vítima de algum crime, violento ou não.

Furto ou roubo de celular, golpes pela Internet, violência em geral, dentre outros, tornaram-se lugar comum e as pessoas não mais ficam indignadas, o que é péssimo, vez que a insegurança não pode ser vista como algo normal.

E o pior é que o Estado em geral, incluindo o Poder Judiciário, no caso os Tribunais Superiores, e o Governo Federal, tratam o tema com desdém, envoltos em uma bolha hermeticamente fechada em que vivem cercados de segurança e pompa, ao passo que a população sofre todos os dias com o incremento da criminalidade.

Não vou tratar de assuntos eminentemente técnicos sobre os quais cansei de escrever e de dar entrevistas, bastando pesquisar.

Os julgamentos pelo STF de ontem, dia 03 de abril de 2023, bem demonstram o descaso com a sociedade de bem.

A “ADPF das favelas” é um exemplo e o outro a proibição, ao menos em parte, das chamadas revistas íntimas dos visitantes dos presos.

O desfecho da aludida ADPF já era sabido e consabido. Dentre outras, determinar ao Estado que retome as áreas ocupadas pelo crime organizado, agora muito mais armado e preparado para conter qualquer ação policial, que fatalmente resultará muitas mortes, é o cúmulo do paradoxo.

O que se pretendia evitar com uma decisão absurda de proibir ações policiais regulares nas comunidades, fortaleceu o crime organizado e criou um estado paralelo dentro do Estado oficial onde impera a “lei do cão”, havendo até pena de morte para quem descumprir as regras dos criminosos.

Agora, depois de fortalecer o crime organizado, mandar a polícia retomar o que nunca deveria ter sido tomado, é algo surreal.

É certo que a situação nas comunidades cariocas já era ruim, mas atualmente está péssima, praticamente incontrolável e irreversível sem um banho de sangue dos bandidos, dos moradores e, também, dos policiais, que terão de enfrentar marginais muito bem equipados e treinados em ações de guerrilha.

Com isso, se a intenção era reduzir a letalidade policial, o tiro saiu pela culatra, posto que para que o estado de direito volte a imperar naqueles locais, o preço será altíssimo e pago com derramamento de muito sangue, inclusive de inocentes.

Quem pensa que as facções criminosas que dominam as comunidades irão simplesmente se render e sair do local, engana-se. A resistência será feroz e importará muito mais violência, contrariamente ao pretendido ao serem proibidas as ações policiais regulares nas comunidades.

É isso que ocorre quando se imiscui em função alheia, no caso de segurança pública, de competência dos Estados membros por expressa determinação constitucional.

Ao menos na questão das revistas íntimas, por enquanto, será permitida quando o presídio não contar com scanner corporal ou aparelho equivalente. Se quiser entrar, tem de permitir a revista, que deverá ser realizada com todo o cuidado para violar ao mínimo a intimidade e dignidade do visitante. E só será permitida quando houver fundadas razões, isto é, sempre, já que agora sim é que os bandidos valer-se-ão muito mais das visitas para introduzir drogas, armas, celulares e outros objetos proibidos nas unidades prisionais, notadamente nas que não possuem equipamentos eletrônicos para as revistas pessoais.

Enquanto isso, dezenas de pessoas foram condenadas sem conduta individualizada, de “baciada”, por um quebra-quebra, vandalismo claro, a penas absolutamente desproporcionais à conduta cometida. Alguns sem conduta nenhuma, simplesmente por estarem no local protestando e tirando fotos sem mais nada fazer e outros com ações insignificantes para o direito penal.

Sem contar, ainda, que praticamente todos os processos da operação lava-jato foram anulados em razão de vícios formais, não reconhecidos em três instâncias por oitomagistrados diferentes, colocando na rua e com a ficha limpa os maiores corruptos que este país já conheceu, muitos confessos e que restituíram ao Estado parte do que receberam ilegalmente, fazendo com que o Brasil seja reconhecido internacionalmente como o país da corrupção e da impunidade, onde o crime compensa.

Enfim, este é o retrato do Brasil atual em que a criminalidade séria, aquela que coloca em risco a própria existência do estado de direito, age livre, leve e solta, ao passo que falar algo indesejado ou simplesmente protestar contra o que entende errado, pode render processo e cadeia brava.

Tristes dias para o Brasil e para o direito, que existe para uns e é quase que desconsiderado ou vilipendiado para outros.

* César Dario Mariano da Silva é procurador de Justiça, mestre em Direito das Relações Sociais, especialista em Direito Penal. Escritor, professor e palestrante.

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