O Projeto de Lei 4.015/2023 que aumenta as punições para crimes contra membros do Judiciário e do Ministério Público, aprovado no Congresso Nacional e que foi à sanção presidencial, traz também um dispositivo que pode reduzir a publicidade sobre salários e gratificações recebidas por esses agentes públicos.
Cristiano Pavini, da Transparência Brasil, alerta no Estadão que a mudança poderá ser usada como justificativa para limitar o acesso a dados de remuneração de servidores do alto escalão. “Já há MPs que dificultam o acesso com exigência de documentos pessoais. Agora, com essa redação, a restrição pode virar regra”, disse.
Pavini lembra que órgãos como os MPs do Rio de Janeiro, Acre, Mato Grosso e Pernambuco já impõem barreiras que constrangem quem tenta monitorar os pagamentos.
Em 2023, o CNMP modificou sua resolução sobre o tema, exigindo identificação de quem acessa dados salariais e alegando motivos de segurança. A alteração proposta pelo projeto de lei aprofunda essa tendência e pode institucionalizar o sigilo em nome da “proteção de dados pessoais”.
Especialistas em direito digital criticam a tentativa de criar uma proteção especial para membros do Judiciário.
“A inserção de regras especiais para membros do Poder Judiciário quebra a lógica de uma lei que é geral e isso causa uma distorção. Há de se questionar por que esses titulares de dados deveriam ter uma proteção especial? Todo o restante são cidadãos de segunda classe?”, afirmou Bruno Bioni, professor da ESPM, ao jornal paulista.
A proposta foi aprovada na Câmara no dia 8 de abril e seguiu para sanção presidencial em 15 de abril. O relator na Câmara, deputado Rubens Júnior (PT-AM), afirmou que manteve a versão aprovada no Senado. O relator na Casa Alta foi o senador Weverton Rocha (PDT-MA), que não comentou o motivo da inclusão da medida.
A Casa Civil, até o momento, não esclareceu se o presidente Luiz Inácio Lula da Silva pretende vetar o trecho polêmico. A omissão do governo, aliás, tem alimentado críticas sobre a conivência com iniciativas que favorecem o fechamento de informações públicas em um momento em que o próprio governo é cobrado por maior transparência.
Enquanto isso, representantes de corporações beneficiadas minimizam os efeitos da proposta. O presidente da ANPR, Ubiratan Cazetta, alegou ao Estadão que “a alteração na lei não tem esse impacto de divulgação ou não de remuneração”, justificando que o objetivo seria apenas “evitar exposição”. A AMB (Associação dos Magistrados do Brasil) diz que o sigilo dos dados atende à LGPD e à Constituição.
Nos últimos meses, vários veículos de imprensa têm publicado matérias sobre salários e penduricalhos recebidos por juízes, desembargadores e promotores que ultrapassam o teto constitucional, o que levou o Legislativo a se debruçar sobre outro projeto, para restringir os supersalários.