Levantamento feito pelo Estadão revela que, em três cidades, o número de pagamentos do Pé-de-Meia é maior que o de estudantes matriculados. Outras 15 localidades têm mais de 90% dos alunos recebendo o benefício. O Ministério da Educação (MEC) nega irregularidades e alega que trabalha para corrigir inconsistências.
O programa Pé-de-Meia, criado pelo governo Lula, tem mais beneficiários do que estudantes matriculados em ao menos três cidades: Riacho de Santana (BA), Porto de Moz (PA) e Natalândia (MG). O levantamento também aponta que, em outras 15 cidades, mais de 90% dos alunos estão cadastrados no programa.
Em Riacho de Santana (BA), o MEC pagou o benefício a 1.231 estudantes em fevereiro. No entanto, o único colégio público de ensino médio da cidade informou que tem 1.024 alunos matriculados. A Secretaria de Educação da Bahia reporta 1.677 estudantes, enquanto o MEC alega que são 1.860. Em Porto de Moz (PA), foram 1.687 pagamentos em fevereiro, mas os diretores das duas escolas locais contabilizam apenas 1.382 estudantes. O MEC fala em 3.105 matrículas na cidade. Em Natalândia (MG), foram 326 beneficiários para 317 alunos oficialmente matriculados, enquanto o MEC lista 600 estudantes.
Além do número de beneficiários ser superior ao de alunos matriculados, o programa também tem registros de pagamentos a pessoas fora dos critérios estabelecidos. O Pé-de-Meia exige que a renda familiar seja de até meio salário mínimo por pessoa, mas servidores municipais com salários superiores a R$ 5 mil aparecem como responsáveis por jovens que receberam a bolsa.
Em Riacho de Santana (BA), a professora Amélia de Souza Oliveira, com salário líquido de R$ 4,3 mil, foi listada como responsável por um beneficiário. Ela também é proprietária de uma farmácia na cidade. Outro caso é o da professora Nelma de Oliveira Silva Rocha, que tem rendimento líquido de R$ 3,8 mil e figura como responsável por um estudante que recebeu o benefício. Em Porto de Moz (PA), quatro professoras do ensino fundamental, com ganhos acima de R$ 5 mil, estão na lista de pagantes do programa.
Segundo especialistas, falhas no Cadastro Único (CadÚnico) podem explicar algumas dessas distorções, mas a lentidão para atualizar informações expõe fragilidades na gestão do programa.
As regiões Norte e Nordeste concentram a maior parte dos beneficiários do Pé-de-Meia, o que coincide com os estados onde Lula teve maior votação em 2022. O programa permite que o estudante acumule até R$ 9,2 mil ao longo do ensino médio, e seu custo anual está estimado em R$ 12,5 bilhões.
O levantamento comparou os dados do MEC com o Censo Escolar de 2023 e identificou 81 cidades onde o número de beneficiários é pelo menos 20% maior que o de alunos registrados. Em algumas cidades, há mais pagamentos do que estudantes, sugerindo falhas ou fraudes no programa.
Diante das denúncias, o MEC afirmou que inconsistências são causadas por erros de repasse das Secretarias Estaduais de Educação e que a pasta trabalha para corrigir os problemas.