O IBGE diz que o desemprego caiu à taxa histórica de 6,1% e o governo Lula esfrega o dado na cara dos críticos, convencendo-se de que faz um bom trabalho. Jornalistes e analistes políticos macaqueiam o discurso encomendado e Márcio Pochmann diz que questionar as estatísticas é a morte da democracia — só faltou recorrer à Advocacia Geral da União e ao STF. Inconformado, Jair Bolsonaro foi às redes dizer que o desemprego divulgado pelo governo “é uma mentira”. “Quem não procura emprego, para o IBGE, está empregado. Quem recebe Bolsa Família, está empregado”, diz, citando a alta nos pedidos de seguro-desemprego como contraponto aos dados oficiais.
Sabemos todos que a taxa de desemprego no Brasil é calculada por meio da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) Contínua, que segue recomendações da Organização Internacional do Trabalho (OIT) e critérios estabelecidos lá em 2012. Sabemos também que, de acordo com a metodologia, são consideradas desempregadas as pessoas que “procuraram trabalho ativamente” e que não conseguiram uma vaga no período analisado. Significa que indivíduos economicamente ativos e em idade para trabalhar não são incluídos na força de trabalho, caso não tenham procurado trabalho. Ou seja, não entram no cálculo de desempregados.
A pergunta que cabe é? Beneficiários do Bolsa Família têm mais ou menos estímulo para procurar emprego? E quem está recebendo seguro-desemprego ou aqueles que acumulam vários benefícios? Quem trabalha na informalidade e recebe o Bolsa Família vai dizer que está empregado ou procurando emprego, sabendo do risco de perder parte ou até a integralidade de seus benefícios? Ora bolas, não é coincidência que o gráfico do desemprego no Brasil tenha trajetória descendente no mesmo período em que o gráfico do Bolsa Família mostra trajetória ascendente! Se os 37 milhões de adultos beneficiários do Bolsa Família fossem considerados desempregados, a taxa seria de 43%! No mínimo, a PNAD Contínua tornou-se obsoleta para avaliação real de desemprego.
Pegue o caso do Maranhão, que foi governado por Flávio Dino e que apresentou na PNAD deste ano apenas 7,3% de desempregados. Seria motivo de comemoração, um sólido legado de desenvolvimento e prosperidade. Só que não! O estado, que mantém a liderança do pior IDH do país, ostenta 659 mil empregos com CLT e 1,2 milhão de famílias recebendo o Bolsa Família. Quantos desses beneficiários trabalham ou estão procurando emprego? Quantos disseram ao entrevistador do IBGE que estão empregados informalmente? Essa situação (número de beneficiários maior que o de trabalhadores CLT) se repete em outros 11 dos 27 estados da federação! Onze!
Claro está que a metologia usada pela OIT e pelo IBGE para estabelecer o índice de desemprego não sobrevive à realidade fantástica de um país como o Brasil. Ela deve ser questionada, sim! Servir, no máximo, ao debate saudável e republicano. Mas para descobrirmos o real número de desempregados vamos ter de lançar mão de outros dados disponíveis, como índice de produtividade ou os já mencionados aqui, para convergirmos, quem sabe, a números consistentes. Números que contribuam para a construção de políticas públicas capazes de resolver nossos problemas e não de maquiá-los. O brasileiro não vive dentro da propaganda partidária, do discurso presidencial ou de tuitadas nas redes.
O caminho para descortinarmos o desemprego no Brasil passa pela revisão profunda dos critérios do Bolsa Família, que virou uma espécie de cabide geral de empregos. Mentir para si mesmo é sempre a pior mentira.