Texto aprovado amplia abertura do mercado, redefine subsídios e muda cálculo dos royalties do petróleo
A comissão mista que analisa a Medida Provisória 1304/2025, conhecida como MP do setor elétrico, aprovou hoje (30) o relatório do senador Eduardo Braga (MDB-AM). O texto altera regras de subsídios, abre o mercado de energia para todos os consumidores e muda o cálculo do preço de referência do petróleo — base para o pagamento de royalties a estados, municípios e à União.
O projeto segue para votação nos plenários da Câmara dos Deputados e do Senado, com validade até 7 de novembro.

Durante a sessão, parlamentares retiraram o trecho que mantinha a obrigatoriedade de contratação de usinas térmicas a gás em regiões sem fornecimento do produto. A exclusão foi proposta pelo deputado Isnaldo Bulhões (MDB-AL) e apoiada pelo líder do governo no Congresso, Randolfe Rodrigues (PT-AP). O deputado Danilo Forte (União-CE) criticou a decisão, afirmando que ela “contradiz o discurso do governo de transição energética levado à COP30”.
Principais pontos da MP
Abertura do mercado
A proposta prevê que todos os consumidores poderão escolher seu fornecedor de energia até 2028.
- Indústria e comércio: agosto de 2026.
- Demais consumidores: dezembro de 2027.
O texto cria o “supridor de última instância”, responsável por garantir o fornecimento caso o contratado falhe.
Limite de subsídios
A MP institui um teto para a Conta de Desenvolvimento Energético (CDE), que hoje soma R$ 50 bilhões. A CDE reúne subsídios e programas como Tarifa Social e Luz Para Todos. A partir de 2027, cada benefício terá um limite orçamentário, e os setores favorecidos deverão custear eventuais excessos.
Exceções: Tarifa Social, Luz Para Todos e custos administrativos da CDE, CCC e RGR.
Royalties do petróleo
O texto muda a metodologia do preço de referência do petróleo, usado para calcular os royalties. O valor passará a ser definido com base nas cotações internacionais e, na ausência dessas, pela Lei de Preços de Transferência. A mudança pode aumentar a arrecadação em até R$ 83 bilhões na próxima década, segundo a RefinaBrasil.
Armazenamento de energia
A Aneel será responsável pela regulação e fiscalização de sistemas de armazenamento de energia em baterias, com incentivos fiscais antecipados da Reforma Tributária para 2026. A medida visa equilibrar o sistema diante do crescimento de fontes intermitentes como solar e eólica.

Curtailment e compensação
O projeto cria um mecanismo de compensação para empresas afetadas por cortes de geração forçada desde setembro de 2023, prática que reduz a produção de energia para ajustar a oferta à demanda.
Geração distribuída (GD)
A proposta impõe um encargo às novas unidades de GD que não tiverem armazenamento próprio, para financiar investimentos em baterias nas distribuidoras. Sistemas de até 75 kW ficam isentos. O Ministério da Fazenda defendeu incluir o fim antecipado dos incentivos à GD, mas o relator não acatou.
Gás e carvão
O texto de Braga restabeleceu benefícios para usinas térmicas a gás e carvão. Apesar da retirada da obrigatoriedade de contratação de térmicas sem fornecimento de gás, o relatório mantém a prorrogação de usinas a carvão até 2040.
Críticas e alertas do setor
Especialistas da ABRACE Energia classificam a tramitação da MP como “precipitada” e o relatório como “ambíguo”.
“É lamentável um relatório apresentado à noite e votado na manhã seguinte. Isso não é democrático”, disse um analista da associação.
A entidade reconhece avanços, como o teto para a CDE e o empoderamento da Aneel, mas critica o uso da reserva de capacidade para custear novas térmicas.
“O texto faz o discurso de reduzir a CDE, mas joga custos na reserva de capacidade”, afirmou outro técnico.
A ABRACE também apontou a inclusão de “jabutis” para contratação compulsória de 4,25 GW a gás em Porto Velho e 333 MW em Goiânia, além de biomassa e carvão, com possibilidade de adição de baterias.
“O grande objetivo da térmica é levar o gás. Não é a térmica, é o duto.”
Segundo os analistas, o preço térmico regional, sem metodologia clara, pode “chegar ao infinito”, comprometendo a previsibilidade do setor.
Efeitos sobre o mercado
A ABRACE avalia que o novo modelo aumenta custos e distorce a competição.
“Se eu fosse um gerador eólico hoje, diria que estou ferrado. Acabou o mercado para mim”, disse um participante do debate.
A associação teme ainda uma “fuga para a autoprodução”, já que consumidores industriais buscarão alternativas fora do sistema regulado para escapar de encargos da CDE e da reserva de capacidade.
“O governo diz que protege o consumidor, mas apenas trocou a caixinha do custo — da CDE para a reserva de capacidade.”
