O presidente da Confederação Nacional dos Agricultores Familiares e Empreendedores Rurais (Conafer), Carlos Roberto Ferreira Lopes, está no centro de um escândalo de roubo envolvendo o INSS. Além de ser dono de uma loja de artesanato indígena no Aeroporto Internacional de Brasília, Lopes é pecuarista, proprietário da empresa de gado Concepto Vet e controlador da holding Farmlands, sediada nos Estados Unidos. O filho administra a mineradora Lagoa Alta, em Minas Gerais.
A Conafer é uma das entidades sob investigação da Controladoria-Geral da União (CGU) e da Polícia Federal por envolvimento no esquema de descontos indevidos em aposentadorias e pensões do INSS. Segundo relatório da CGU, a confederação teria firmado Acordos de Cooperação Técnica (ACTs) com o instituto, permitindo os roubos mensais nas folhas de pagamento dos beneficiários, mesmo sem autorização expressa dos aposentados.
A entidade tinha autorização do governo federal para atuar dentro de territórios indígenas, oferecendo uma espécie de “assessoria” para garantir o acesso a benefícios previdenciários. A presença da Conafer em comunidades indígenas se intensificou a partir de 2018, com patrocínio de assembleias, entrega de cestas básicas, torneios de futebol e mutirões previdenciários. Lideranças indígenas ouvidas relataram que esse acesso era facilitado por incentivos financeiros, como aluguel de caminhonetes e pagamento de salários a lideranças locais.
Investigações da CGU apontam que, desde 2019, a Conafer arrecadou cerca de R$ 688 milhões em valores descontados diretamente dos benefícios de camponeses e indígenas. A entidade também é citada na Operação Sem Desconto, deflagrada em abril de 2025 pela Polícia Federal.
Um dos assessores de Carlos Lopes, Cícero Marcelino de Souza Santos, aparece como operador financeiro da Conafer em transações suspeitas com José Laudenor, auxiliar administrativo com renda de R$ 1,5 mil. Apesar da renda modesta, Laudenor é sócio de José Carlos Oliveira — ex-presidente do INSS e ex-ministro do Trabalho e Previdência no governo Bolsonaro — em duas empresas: a Fayard Organizações e Serviços Empresariais e a Yamada e Hatheyer Serviços Administrativos LTDA, esta última também com a filha de Oliveira e o ex-diretor de Benefícios do INSS, Edson Akio Yamada, no quadro societário.
Relatórios do Coaf enviados à PF indicam que essas transações podem configurar indícios de lavagem de dinheiro, com movimentações fracionadas e uso de terceiros para ocultar origem de recursos. Embora citado nas investigações, José Carlos Oliveira não foi alvo direto da operação.
As suspeitas ganharam força após o Metrópoles revelar, em março de 2024, que 29 entidades autorizadas a descontar mensalidades associativas de aposentados apresentaram aumento de 300% no faturamento em apenas um ano, enquanto enfrentavam mais de 60 mil ações judiciais por descontos indevidos. A análise mostrou que muitos aposentados sequer conheciam as entidades responsáveis pelos descontos que variavam de R$ 45 a R$ 77 mensais.
Após a revelação, o INSS iniciou procedimentos internos e o diretor de Benefícios, André Fidelis, foi exonerado.
Em resposta, Carlos Lopes e a Conafer alegam atender mais de 8 milhões de associados em 4.500 municípios e que as atividades pessoais do presidente como pecuarista não interferem nas operações da entidade. Sobre a loja no aeroporto, a Jaguar Artes Indígenas, afirmam que o objetivo é destacar e comercializar peças produzidas em aldeias indígenas. A entidade também declarou que apenas 11% de sua receita provêm de recursos oriundos do INSS.