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Decisão da Primeira Turma contra Alexandre Ramagem é tecnicamente insustentável

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Por César Dario Mariano da Silva*

A questão é muito simples de ser resolvida. O deputado Alexandre Ramagem e os demais acusados foram denunciados por tentarem derrubar o governo legitimamente constituído e por tentarem abolir o estado democrático de direito, além de constituição de organização criminosa (vide item 1).

E, de acordo com a denúncia, os atos anteriores à diplomação de Ramagem estão diretamente ligados aos atos de 8 de janeiro, quando o acusado já era deputado federal, isto é, houve resultado material do mero planejamento realizado antes de sua diplomação.

Pois bem.

Se o planejamento foi colocado em prática com os atos de 8 de janeiro, temos uma progressão criminosa, que desencadeou naquela depredação de prédios públicos, o que poderia até justificar o recebimento da denúncia, desde que devidamente individualizadas as condutas e existentes indícios suficientes de autoria ou de participação no crime.

Neste caso, o crime ainda estava ocorrendo até sua execução material em 8 de janeiro, ou seja, o planejamento foi colocado em prática. Nesta hipótese, como ainda estava ocorrendo o delito até 8 de janeiro, quando o deputado já estava até empossado e no exercício de suas funções, pode a Câmara dos Deputados sustar a ação penal (vide item 2).

Por outro lado, se for desvinculado o planejamento dos atos de 8 de janeiro, a conduta de Ramagem e dos demais acusados ficará apenas na fase preparatória do delito, não sendo punível no âmbito penal, já que não houve o início da execução dos crimes de golpe de estado e de abolição violenta do estado democrático, lembrando que a deposição do governo pressupõe que o presidente já estivesse empossado, vez que não se depõe quem ainda sequer assumiu suas funções presidenciais.

As duas condutas têm como verbo do tipo “tentar”, que indica o início da execução do crime, sendo certo que desde 1940 pelo menos, com o início da vigência do Código Penal, não se pune a cogitação e nem a preparação de um crime, exceto se houver previsão legal em sentido contrário, que é o caso do crime de organização criminosa, que pune atos preparatórios.

No que tange ao crime de organização criminosa, pressupõe estabilidade e permanência do grupo criminoso. Dessa forma, trata-se de crime permanente, cuja consumação se prolonga no tempo, isto é, até os atos de 8 de janeiro ou mesmo após, desde que o grupo ainda estivesse junto.

Neste caso, com mais razão, por ser delito permanente, o deputado estaria cometendo o crime já diplomado e empossado, o que possibilita a sustação do processo por sua Casa legislativa. Enfim, não há como tecnicamente sustentar a inconstitucionalidade da sustação do processo contra Ramagem, vez que a Câmara dos Deputados simplesmente fez valer dispositivo constitucional que lhe dá essa prerrogativa.

* César Dario Mariano da Silva é procurador de Justiça, mestre em Direito das Relações Sociais, especialista em Direito Penal, professor e palestrante. Autor de diversas obras jurídicas, dentre elas: Comentários à Lei de Execução Penal, Manual de Direito Penal, Lei de Drogas Comentada, Estatuto do Desarmamento, Provas Ilícitas e Tutela Penal da Intimidade.

 

 

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