Circula nas redes sociais a notícia de que o governo do trabalhista Keir Starmer, no Reino Unido, estaria visando oito milhões de britânicos que moram sozinhos, com planos de que recebam imigrantes em seus lares.
Não há, contudo, qualquer registro de veracidade dessa informação. Também é falso que o governo britânico esteja pedindo para proprietários que compartilhem suas casas com imigrantes.
O que existe é uma crise provocada no final de abril quando a Serco, uma das empresas contratadas para abrigar temporariamente os “solicitantes de asilo”, termo favorecido pelas autoridades britânicas para os imigrantes ilegais que chegam em embarcações pelo Canal da Mancha, marcou uma reunião com proprietários de residências para convencê-los a alugá-las na íntegra (não em partes, como quartos) para abrigar essas pessoas.
São abrigos temporários até que sejam deportadas, se assim decidido, após o devido processo legal.
A empresa tem intermediado abrigos temporários para os imigrantes ilegais desde 2012. A busca de proprietários pela Serco faz parte de um plano do governo Starmer para reduzir os custos de processamento legal dos imigrantes: enquanto o custo da diária em hotéis é de na média 145 libras esterlinas, o custo em uma casa privada pode baixar até a 14 libras, segundo o jornal The Telegraph.
O governo prometeu para os proprietários no mínimo cinco anos de aluguéis garantidos em contrato com a empresa, que também cobriria custos de manutenção, reparos, gás e energia, além de impostos locais.
Após a repercussão negativa, a Serco cancelou a reunião, que aconteceria em Malvern Hills, uma bela região no oeste da Inglaterra. A empresa diz em seu site que já abriga mais de 30 mil imigrantes em cerca de sete mil propriedades.
Segundo o Ministério do Interior, mais de oito mil imigrantes chegaram ao litoral da Grã-Bretanha em pequenas embarcações este ano. “Temos o dever legal de apoiar solicitantes de asilo pobres que não conseguem pagar as contas”, disse um porta-voz do órgão.
“Estamos restaurando a ordem ao sistema de asilo e cortando os custos para o pagador de impostos pela redução do número de pessoas que somos obrigados a acomodar, através de um aumento rápido na velocidade do processo decisório e da remoção de mais de 24 mil pessoas que não têm direito de estar no Reino Unido”, afirmou o porta-voz em coletiva de imprensa.
O Reino Unido passa por uma crise de moradia. O preço médio do aluguel saltou de 950 libras em 2016 para 1332 libras até março deste ano, segundo o Gabinete Nacional de Estatísticas (ONS).
Especialistas ouvidos pela BBC há dois dias disseram que a situação de moradia de Londres está fugindo ao controle: em um ano, houve um aumento de 8% no número de pessoas sem teto dormindo em locais públicos, atingindo mais de 4.400. Contando com quem está em abrigos, são 183 mil pessoas sem residência própria na capital.
A lei obriga as autoridades municipais a abrigarem quem não tem onde morar, e os custos estão ficando insustentáveis para os conselhos municipais (equivalentes a câmaras e prefeituras). Os conselhos londrinos gastaram 330 milhões de libras a mais do que pretendiam em acomodação no último ano, um aumento de 68%.
Nessas condições, não é surpresa a revolta de muitos britânicos quando o governo pretende expandir seu programa de abrigo temporário de imigrantes ilegais para casas e apartamentos privados.
Brasileiros comentando a situação também têm chamado o governo Starmer de “socialista”. É uma opinião livre, mas o Partido Trabalhista do primeiro-ministro, sob a liderança de Tony Blair em 1995, abandonou ao menos em tese o socialismo ao se livrar da “Cláusula 4” de seu estatuto, que previa “propriedade coletiva dos meios de produção”. Mais recentemente, o político Jeremy Corbyn, que liderou o partido por cinco anos até 2020, tentou restaurar a cláusula, sem sucesso. No ano passado, Corbyn saiu do partido.