A Itaipu Binacional firmou mais de 120 convênios socioambientais, totalizando quase R$ 2 bilhões desde a posse de Enio Verri, diretor-geral brasileiro da usina, em março de 2023. O crescimento dos gastos, bancados pela conta de luz dos consumidores do Sul, Sudeste e Centro-Oeste, levanta questionamentos sobre critérios e transparência na aplicação dos recursos.
Um dos exemplos é o convênio “Bio Favela – Cufa e Itaipu pela Vida na Favela”, que prevê R$ 24,5 milhões entre 2024 e 2027 para atender comunidades carentes com atividades educacionais e esportivas. Apesar do objetivo social, a prestação de contas revela números exagerados e discrepantes, como a compra de 3.150 bolas esportivas por R$ 200 cada, um volume que ultrapassa a necessidade do projeto.
Compra de bolas
Inicialmente, a Athus, ONG responsável pelo convênio, emitiu nota fiscal para 2.100 bolas a R$ 300 cada. Após revisão, o valor caiu para R$ 200, mas a quantidade aumentou para 3.150 unidades. O contrato prevê o atendimento de 600 crianças, o que significa quase três bolas por beneficiado.
As bolas informadas na prestação de contas são modelos profissionais de alto desempenho, como a Penalty Crossover Tam 7 (basquete) e a Penalty Max 1000 Termotec XXIV (futsal), que custam até R$ 500 no varejo. No entanto, registros fotográficos mostram crianças utilizando modelos mais baratos, que a ONG alega serem brindes.
Outro ponto controverso é o fornecedor. A empresa Cocatto Sportes, que vendeu as bolas, tem registro como microempresa (ME), com limite de faturamento de R$ 380 mil anuais. No entanto, a venda para a Itaipu foi de R$ 630 mil, quase o dobro do limite permitido para essa categoria.
Treinamento de gestores públicos
Outro convênio questionado é o “Programa de Capacitação AMP 4.0”, de R$ 48 milhões para qualificação de servidores municipais. A Associação de Municípios do Paraná (AMP), responsável pelo projeto, não ministra os cursos diretamente, mas terceiriza a função para instituições de ensino, o que pode ser considerado irregular pelo Tribunal de Contas da União (TCU).
No entanto, como a Itaipu é uma estatal binacional, seus gastos não são fiscalizados pelo TCU. O único órgão que pode exigir explicações é o Congresso Nacional, mas apenas em relação ao montante administrado pelo Brasil.
Gastos bilionários e impacto na conta de luz
Os projetos de Itaipu são financiados por meio da tarifa de energia elétrica, cobrada compulsoriamente dos consumidores do Sul, Sudeste e Centro-Oeste. Em 2024, a estatal destinou US$ 450 milhões (R$ 2,5 bilhões) para esses programas, sob a justificativa de cumprir sua “missão socioambiental”.
A Itaipu afirma que faz monitoramento rigoroso para garantir a correta aplicação dos recursos e que a Athus apresentou orçamentos detalhados e justificativas para os preços praticados. Sobre o convênio com a AMP, a estatal alega que a entidade tem experiência na gestão de programas públicos e seguiu critérios técnicos na escolha das instituições de ensino.