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Desextinção: cientistas alegam ter ressuscitado espécie de lobo desaparecida há 10 mil anos

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O lobo-terrível, Aenocyon dirus, canídeo branco que podia chegar a 1,80 metro de comprimento e 70kg, habitou as Américas até há 10 mil anos, quando foi extinto. E em 1º de outubro de 2024, a espécie ressuscitou.

Ao menos segundo a empresa americana que produziu os embriões: a Colossal Biosciences, fundada em 2021, que emprega 130 cientistas. A “ressurreição”, contudo, pode ser um exagero.

Dois filhotes com nomes dos fundadores mitológicos de Roma, Remus e Romulus, nasceram de uma cadela. Há também uma fêmea nascida há dois meses, Khaleesi.

Hoje a empresa publicou no X um vídeo dos dois filhotes machos uivando. “Você está ouvindo o primeiro uivo de lobo-terrível em mais de 10 mil anos”, disse a Colossal.

Foram usadas novas técnicas de edição de genoma (especialmente CRISPR) para transformar o material genético do lobo cinzento comum do hemisfério norte (Canis lúpus) em autênticos lobos-terríveis. E aqui mora a controvérsia: a maior parte do genoma dos filhotes é de lobo cinzento, as edições foram apenas 20, envolvendo 11 genes.

Sabe-se algo do genoma do lobo-terrível porque ele foi desvendado a partir do DNA preservado em fósseis com idades entre 11.500 e 72 mil anos.

O mamute vem aí

Segundo a revista Time, a Colossal tem planos de desextinguir também o mamute, o dodô e o tigre da Tasmânia. É difícil encontrar objeções à desextinção dos dois últimos, pois foram extintos por atividades humanas.

O tigre da Tasmânia foi morto pelos australianos — trata-se de um marsupial, sem parentesco com o tigre ou com lobos, mas que evoluiu independentemente uma forma muito parecida com a dos canídeos para ocupar o nicho ecológico de predador. O último morreu em um zoológico em 1936.

O dodô, nativo da ilha de Maurício, a leste de Madagascar, era uma “galinhona” dócil de 20 kg e um metro de altura que, previsivelmente, tornou-se uma iguaria para navegantes. O último registro de avistamento data de 1662.

Com o lobo-terrível e o mamute, é diferente. Não está tão claro que foi a ação do homem que causou essas extinções, pois houve também a alteração natural do clima. Os ecossistemas em que ambas as espécies viviam, na última era do gelo, também foram extintos. Portanto, só poderiam ser reintroduzidos em cativeiro, pois, caso escapassem e se multiplicassem na natureza, poderiam causar instabilidades ecológicas e até novas extinções.

Há um mês, a Colossal surpreendeu o mundo ao anunciar camundongos cujos genomas foram alterados para produzir a pelagem ruiva, longa e densa dos mamutes. O chefe executivo da empresa, Bem Lamm, disse em nota que “pela engenharia de características múltiplas de tolerância ao frio evoluídas no mamute em uma espécie modelo vivente, provamos nossa capacidade de recriar combinações genéticas complexas que a natureza demorou milhões de anos para criar”.

A empresa não vê suas ações como mero marketing, mas passos no desenvolvimento de técnicas de desextinção para reverter o que muitos cientistas acreditam que está acontecendo hoje: extinção em massa.

Como a empresa se justifica

Um milhão de espécies estão hoje ameaçadas de extinção, diz a Colossal em seu site, 150 já estariam se extinguindo por dia e até 55 mil por ano. Os biólogos não sabem ao certo quantas espécies existem no planeta, até porque para certos seres vivos o conceito de “espécie” fica bastante nebuloso comparado à facilidade com que se pode diferenciar um lobo-terrível de um cachorro. Estimativas estão em torno de 10 milhões de espécies ou mais.

“A solução é a desextinção, uma aplicação funcional de tecnologia avançada de edição de genes com meta na reconstrução do DNA da megafauna e outras criaturas perdidas que tinham um impacto positivo mensurável em nossos frágeis ecossistemas”, afirma a empresa.

É, honestamente, um papo de marqueteiro que esconde os riscos mencionados acima. Seria mais honesto admitir que estão desextinguindo espécies para mostrar que podem e porque, de um ponto de vista amplo, é extremamente edificante para todos nós. Algo parecido com os motivos declarados pelo governo americano para a visita à Lua em 1969.

Claramente, as primeiras escolhas de desextinção têm mais a ver com o carisma das espécies: o lobo-terrível e o mamute são simplesmente legais. Se a prioridade fosse desfazer impactos ambientais, o dodô e o tilacino (outro nome para o tigre da Tasmânia) seriam prioridade.

Para ser justo, a chefe de ciência da empresa, Beth Shapiro, já utiliza as justificações mais honestas e, francamente, mais inspiradoras. “Somos uma força evolutiva agora”, disse ela não só sobre sua equipe, mas sobre a humanidade como um todo, para a revista Time. “Estamos decidindo qual será o futuro dessas espécies”.

Olhando para a própria humanidade e as taxas de natalidade por país, tenho uma sugestão para a Colossal Biosciences: evitar a extinção do coreano.

Atualização: foram feitas modificações no artigo para refletir o fato de que os três filhotes possuem, na verdade, a maior parte de seu genoma derivada do genoma de lobo cinzento.

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