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A miragem da COP30

Por Lorenzo Carrasco e Geraldo Luís Lino

A notória inadequação de Belém (PA) para sediar a conferência climática COP30 ressalta que a escolha da cidade foi motivada pela indisfarçável pretensão do presidente Luiz Inácio Lula da Silva de usar o evento para alavancar o pretendido papel de liderança do Brasil na agenda climática – e o dele próprio como o grande líder global da “sustentabilidade”.

Nesse cenário, que mais se assemelha a uma miragem, a COP30 seria uma plataforma para catalisar a atração dos investimentos multibilionários “sustentáveis” que viabilizariam a agenda da “transição ecológica”, consolidando o Brasil como uma “potência verde”, prestadora de serviços ambientais, serviços esses baseados na conversão dos seus biomas em virtuais sumidouros de carbono.

Com a crise de desaprovação que o governo atravessa, tal pretensão vai ganhando contornos de uma bóia de salvação para evitar um naufrágio que parece cada vez mais difícil de ser evitado.

Em uma reveladora entrevista coletiva em 19 de fevereiro (citada no Valor Econômico), o secretário extraordinário para a COP30, Valter Correia da Silva, fez uma advertência sobre a necessidade de as delegações estrangeiras, que estarão em Belém (PA) em novembro, “baixarem as expectativas” sobre a infraestrutura da cidade.

“É como o presidente Lula fala. As delegações precisam baixar as expectativas, porque Belém não é uma Dubai, não é uma Baku (sedes das duas últimas COPs). Mas, dentro das nossas especificidades e vantagens, teremos uma grande COP, um grande evento, uma grande conferência da ONU”, disse ele.

O secretário, que tem conversado com diplomatas estrangeiros sobre a conferência e seus requisitos de logística, infraestrutura e segurança, admitiu que seus interlocutores têm manifestado uma “preocupação generalizada” com a precariedade da capacidade da capital paraense para receber as dezenas de milhares de pessoas esperadas.

Reconhecendo os problemas, ele afirmou que tem recomendado às embaixadas “para não estimularem tantas pessoas a virem desnecessariamente para a COP”.

Todavia, a recepção aos estrangeiros em Belém pode acabar sendo o menor dos problemas para Lula et alii.

A rigor, o próprio marco da “descarbonização” da economia, fundamento dos convescotes anuais da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas (UNFCCC), está ameaçado por uma combinação de fatores que têm evidenciado a sua inviabilidade tecnológica, os altos custos econômicos sociais e políticos e, não menos, a sua inutilidade para uma pauta de cuidados reais com o meio ambiente.

Nas duas últimas edições da COP, em Dubai e Baku, os sinais de perda de ímpeto da “descarbonização” já eram evidentes, com a escassa disposição da grande maioria dos países e empresas para abrir mão do uso dos combustíveis fósseis em um futuro previsível e o interminável impasse sobre o financiamento da mal denominada transição energética.

De fato, nos últimos dois anos, tem se verificado um indisfarçável recuo dos compromissos assumidos pelas majors de hidrocarbonetos com as metas de redução das suas “pegadas de carbono”, reduzindo investimentos em energias renováveis ao mesmo tempo em que ampliam os investimentos nas suas atividades-fim – e, em alguns casos, em fontes energéticas realmente de transição, como energia de fusão.

Um caso típico é a estatal norueguesa Equinor, que anunciou uma redução de 25% da sua meta de geração renovável até 2030, enquanto perseguirá um aumento de 10% da produção de petróleo e gás natural até 2027. A Shell, BP, ExxonMobil e Chevron, entre outras, têm metas análogas.

A Grécia reduz as suas metas de energias renováveis e faz concessões de licenças para a exploração de gás no Mar Jônio.

O vizinho Uruguai, cuja geração elétrica se baseia em mais de 90% em fontes renováveis, também está fazendo concessões para a exploração de petróleo offshore, com as quais espera obter a autossuficiência.

Mais recentemente, a tendência se ampliou com o abandono de várias grandes instituições financeiras (entre elas, o BlackRock, JP Morgan Chase, Morgan Stanley, Bank of America, Citigroup, Wells Fargo, Goldman Sachs e a própria Reserva Federal dos EUA) de organizações dedicadas ao casamento da alta finança com a agenda do “carbono líquido zero” (net zero). Uma delas, a Net Zero Asset Managers (NZAM), chegou a anunciar uma paralisação de suas atividades.

Na esfera política, dois fatos tendem a reforçar esses movimentos.

O primeiro é o retorno de Donald Trump à Casa Branca, onde já iniciou o desmonte do aparelho tecnocrático “verde” do governo norte-americano.

O segundo são as reações crescentes aos excessos regulatórios e aos grosseiros erros de avaliação das políticas ambientais da União Europeia, como a desastrosa “transição energética” alemã baseada no incentivo às fontes eólicas e solares e na desativação de usinas termelétricas e nucleares.

No Brasil, ganham contornos de ebulição as pressões sobre o governo Lula para o encerramento do interminável imbróglio da licença ambiental para a exploração do bloco 59, no litoral norte do Amapá, que dificilmente o aparato ambientalista encastelado no aparelho do Estado, representado pelo Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), terá condições de sustentar por mais tempo.

O próprio presidente encontra-se numa proverbial sinuca de bico, pois sua poderosa ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, se opõe categoricamente à exploração da Margem Equatorial Brasileira, a nova fronteira petrolífera do País, e contrariá-la não estava nos planos de Lula na reta para a COP30.

A obsessão com a conferência, talvez, explique a sua inoportuna e inconveniente conversa telefônica com o presidente francês Emmanuel Macron, um dos líderes europeus atordoados com o choque de realidade resultante do entendimento direto entre os EUA e a Rússia, sem qualquer participação europeia, com vistas a uma retomada das relações bilaterais e uma conclusão do conflito na Ucrânia.

Além de respaldar os muxoxos europeus com a opinião – irrelevante, diga-se – de que eles precisam ser incluídos nas negociações sobre a Ucrânia, Lula recebeu o reforço do apoio de Macron à COP30. “Nós também trabalharemos para que a COP de Belém seja um sucesso e temos, juntos, diversas iniciativas em prol do clima, da biodiversidade, dos oceanos, da democracia e do desenvolvimento econômico e agrícola”, diz o texto divulgado pelo Palácio do Eliseu.

Uma agenda deveras ambiciosa para uma conferência que poderá soar o proverbial dobre de finados para a “descarbonização”.

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