A queixa é incessante e generalizada. Os advogados dos investigados na suposta trama golpista engendrada por Alexandre de Moraes, investigada por Fábio Shor e denunciada por Paulo Gonet até hoje não conseguiram acesso à íntegra da confusa delação de Mauro Cid, usada como reforço retórico para a narrativa do golpe. Tampouco conseguiram que seus clientes fossem ouvidos pelo Ministério Público ou acesso às mídias e aos depoimentos integrais do general Freire Gomes e do brigadeiro Baptista Júnior.
Sem acesso às provas, não há exercício pleno da defesa.
Isso tornará o julgamento de Jair Bolsonaro o palco principal de escrutínio público, não do ex-presidente, mas do próprio Supremo Tribunal Federal. Haverá consequências duradouras para o direito de defesa, mas qualquer análise desapaixonada parece ser inócua. Por isso, é tão importante que criminalistas renomados, como Celso Vilardi e Juca, que já defenderam petistas, tenham topado entrar no jogo.
É como um selo de qualidade técnica, para além de qualquer disputa partidária e ideológica.
Eles, certamente, usarão sua experiência em Direito Penal, o conhecimento da jurisprudência da Corte e o relacionamento com a imprensa para expor ao Brasil e ao mundo a fraude jurídica que nos é apresentada. Sabemos que essa fraude jurídica é uma reação institucional, mas não deixa de ser uma fraude jurídica. E as evidências de fraude são maiores do que aquelas que os acusadores apresentam para demonstrar sua tese.
É interessante como Gonet foi mais ousado que Shor e resolveu enquadrar Bolsonaro no crime de invasão das sedes dos Poderes, mesmo que não haja uma única mensagem, um pronunciamento, um espirro incentivando o ato. Mesmo que a Polícia Federal tenha concluído que não houve financiamento coordenado para trazer essas pessoas a Brasília e a mantê-las em frente ao QG do Exército.
Sabe como o PGR vinculou o ex-presidente? Acusando-o de não ter atuado para desmobilizar os acampamentos. É a primeira vez na história em alguém será julgado por invadir e depredar um lugar onde não estava, numa ação coletiva sobre a qual não disse uma palavra. Seria mais legítimo Gonet chamar Bolsonaro de omisso ou de covarde, por ter viajado para Orlando, mas denunciá-lo dessa forma é uma piada.
Outra piada é quando o PGR diz que Bolsonaro planejou o golpe com apoio das Forças Armadas, sendo que os ex-comandantes Freire Gomes (Exército) e Baptista Júnior (Marinha) são testemunhas da acusação e garantem que nunca apoiaram qualquer aventura. Aliás, Bolsonaro antecipou a transmissão do comando das Forças Armadas para militares indicados por Lula e José Múcio. O próprio Múcio disse recentemente que Bolsonaro interveio para que os comandantes o atendessem para a transmissão.
Como alguém que quer dar um golpe entrega ao adversário político o controle da única instituição capaz de garantir o golpe? Seria mais legítimo chamar Bolsonaro de estúpido, de burro.
O que dizer das mensagens do general Mario Fernandes, que reclamava a amigos por não conseguir chegar ao então presidente da República para convencê-lo a apoiar o tal plano Punhal Verde e Amarelo?
Aliás, Gonet abusa da criatividade ao colocar Bolsonaro como líder de três planos diferentes com objetivos distintos: a chamada minuta do golpe, que previa a decretação do Estado de Defesa, que previa a prisão de Moraes via interpretação do artigo 142; o tal Punhal Verde e Amarelo, que previa o assassinato de Moraes e Lula, e o Copa 2022, que previa a comoção social para ativação das Forças Armadas.
O problema são os próprios fatos expostos na denúncia. Se na reunião do dia 15 discutiu-se o assassinato de todos os ‘inimigos’, por que na do dia 9, no Palácio, o presidente é acusado de retificar o plano para que houvesse apenas a prisão. Como seria possível a coexistência de diferentes planos com objetivos diferentes sendo executados ao mesmo tempo sob a liderança do mesmo sujeito?
Como disse meu nobre colega Leonardo Corrêa, é um circo acusatório. Só que nós somos os palhaços.
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