Um instituto investigado por fraudes contra consumidores tenta usar o escândalo do INSS para obter R$ 2 bilhões em indenizações por supostos danos morais coletivos. Se a ação prosperar, os advogados ligados à entidade podem embolsar até R$ 400 milhões em honorários.
O Instituto Sigilo se apresenta como entidade sem fins lucrativos voltada à defesa de dados pessoais. Para o Ministério Público e a Justiça, trata-se de uma fachada usada para propor ações milionárias visando lucros advocatícios.
As ações são assinadas pelo escritório do advogado Victor Hugo Pereira Gonçalves, que também preside a associação. A Justiça identificou que a estrutura é usada de forma recorrente com o mesmo objetivo: obter ganhos com ações coletivas de alto valor.
A ação contra o INSS e a Dataprev, aberta em fevereiro, acusa os órgãos de violar dados pessoais de beneficiários para permitir ofertas de empréstimos consignados. Em nova petição apresentada no último dia 7, o Instituto alegou que o suposto vazamento integra o esquema investigado na Operação Sem Desconto.
“Somente com ele há viabilização da retirada do dinheiro dos aposentados e pensionistas. Preenchia-se formulários em nome dos titulares dos dados para que as rés [INSS e Dataprev] fizessem os descontos de valores”, afirma a entidade no processo divulgado pelo Metrópoles.
O Instituto também pede a condenação da Autoridade Nacional de Proteção de Dados (ANPD) e solicita o pagamento de honorários em valor máximo – 20% da causa, ou R$ 400 milhões.
A Justiça Federal em São Paulo extinguiu a ação no último dia 21. A decisão da 10ª Vara Cível apontou que o Instituto Sigilo não tem legitimidade legal. A juíza Sylvia Marlene de Castro Figueiredo destacou que não há provas de que a entidade tenha associados além da própria diretoria.
O Ministério Público sustenta que o Instituto é utilizado para ganhos particulares e já foi alvo de operação da Promotoria do DF em fevereiro, que cumpriu sete mandados de busca e apreensão. A entidade é suspeita de prometer benefícios irreais para obter apoio financeiro de vítimas.
Em outros processos, como o movido contra o Nubank, a Justiça já classificou a atuação do Instituto como oportunista. Em 2022, o juiz do caso afirmou que a entidade “não visa proteger os direitos de seus associados, mas apenas os membros de um escritório de advocacia, que se utilizam da fachada de uma associação para propor ações civis públicas totalmente descabidas e em valores exorbitantes”.
Na ocasião, o endereço da associação era o mesmo do escritório do fundador. A decisão foi mantida em segunda instância, com o MP de São Paulo reforçando que a entidade só existia no papel.
Procurado, Victor Hugo Gonçalves afirmou que o Instituto age “rigorosamente dentro da lei” e que atua na defesa de titulares de dados. “Entre as diversas iniciativas do Instituto Sigilo, inclusive educacionais, está a de promover ações postulando danos sociais coletivos”, disse.
Segundo ele, os beneficiários de eventuais decisões seriam os titulares dos dados violados e não o Instituto. “Tudo mais é fumaça gerada por quem quer seguir lucrando, ilicitamente, sobre os dados de brasileiros”, afirmou.
O escândalo envolvendo o INSS foi revelado em reportagens publicadas a partir de dezembro de 2023. As matérias mostraram o crescimento na arrecadação de entidades que cobravam mensalidades de aposentados, somando R$ 2 bilhões em um ano.
As denúncias levaram à abertura de investigações pela Polícia Federal e CGU. Ao todo, 38 reportagens do portal foram citadas pela PF na representação que resultou na Operação Sem Desconto, que levou às demissões do presidente do INSS e do então ministro da Previdência, Carlos Lupi.