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Chineses estão comprando terras nos EUA para fins militares? O que sabemos a respeito

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Reemergiu nas redes sociais esta semana um clipe de uma entrevista do apresentador de TV Phil McGraw (Dr. Phil) com Donald Trump, quando o presidente americano era candidato às eleições, em junho do ano passado.

No vídeo, McGraw apresenta ao político um mapa que mostraria terras dentro do território dos Estados Unidos que foram compradas com o financiamento do “governo chinês”. O preocupante, sugeriu o apresentador, é que muitas das áreas ficam próximas ou em torno de bases militares “estratégicas”, como uma no estado de Utah em que acontecem testes de aviões militares supersônicos em espaço aéreo restrito.

O tema ganha relevância renovada agora que Trump decidiu dar foco principal em suas tarifas de importação na China, impondo 145% sobre as exportações chinesas, ao que a China retaliou elevando seu protecionismo contra os produtos dos Estados Unidos. Depois, Trump esclareceu que a há regimes tarifários diferentes para produtos vindos da China como os smartphones, para os quais a tarifa seria de 20%.

A opinião mais comum entre economistas é que as tarifas são uma má ideia, um tiro no pé, pois afetam principalmente os preços para os consumidores do país que as impõem. Mas alguns, até mesmo o decano Thomas Sowell (que comentou as tarifas em uma rara aparição no canal da Hoover Institution), reconhecem que pode haver um valor “estratégico” nas tarifas como ferramentas de negociação e pressão.

Se for verdade que a China anda utilizando investidores como um braço longo de sua defesa comprando terras próximas a bases militares nos Estados Unidos, não seria o único motivo para que o presidente americano tentasse exercer pressão sobre o país asiático. Há, por exemplo, vários casos em que a ditadura comunista empregou espiões acadêmicos e roubo de tecnologia no território americano.

É verdade que a China está comprando terras nos EUA para fins militares?

O principal problema com o mapa exibido por McGraw, que veio de uma apuração do jornal New York Post, é que as áreas destacadas como alvo dos chineses não são as propriedades rurais em si, mas condados que as contêm. Tipicamente, a área de condados é muito maior que a área de qualquer fazenda individual. Então o efeito do destaque dado pelo jornal é de exagerar a área total adquirida.

Isso foi esclarecido pela agência Snopes, na época da entrevista. A agência afirmou que “reducionismo” dizer que “a China” comprou essas terras, mas teve de reconhecer, como já informamos nesta coluna, que há leis da ditadura chinesa que obrigam qualquer cidadão ou empresa sediada no país a compartilhar informações com o regime, o que efetivamente turva as fronteiras entre Estado e empresas privadas.

Quanta influência o governo chinês exerce sobre as empresas privadas é algo “difícil de determinar”, disse a Snopes. “Reconhecemos que essa ressalva não é muito tranquilizadora.”

A Agência de Serviço Rural dos Estados Unidos relatou em 2022 que investidores chineses tinham posse de cerca de 350 mil acres de terra agricultável no país (cerca de 142 mil hectares). O próprio governo diz que esta seria uma subestimativa, pois, se uma propriedade rural está sob a custódia de investidores ligados a mais de um país, nem sempre as autoridades americanas sabem determinar qual dos países é o principal proprietário.

Essas terras são usadas para espionagem? Para chegar perto de uma resposta, é preciso estudar o comportamento geral de pessoas ligadas ao governo chinês nos Estados Unidos.

Em 2023, o jornal The Wall Street Journal noticiou que mais de 100 chineses, às vezes fingindo interesse em turismo, acessaram áreas militares dentro do território dos Estados Unidos em um ano. Importante: a maioria das invasões ocorreram em áreas rurais, bem longe de rotas turísticas e aeroportos comerciais.

Chegou ao ponto de chineses serem flagrados mergulhando perto do Centro Espacial Kennedy, na Flórida. O centro contém um ponto de lançamento de foguetes. Mergulhadores chineses também foram avistados em Key West, no mesmo estado americano, tirando fotos de um centro de inteligência. Três chineses se declararam culpados de ter invadido uma estação naval na região, em 2020.

As autoridades de inteligência americana preferiram não comentar o relatório do jornal.

E no Brasil?

Investidores chineses também têm comprado terras no Brasil, para fins agrícolas e de infraestrutura. Um dos mais comentados compradores de propriedades rurais no Brasil nos últimos anos tem sido o grupo chinês Pallas International. Em 2018, o economista Delfim Netto chegou a reclamar que “Os chineses compraram a África e estão tentando comprar o Brasil”.

Na mesma época, o diretor-geral da Agência das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura (FAO) fez um alerta para o risco de um “neocolonialismo” no continente africano, referindo-se aos investimentos chineses.

Mais recentemente, entidades especializadas em agronegócios no Brasil, como a Sociedade Nacional de Agricultura, noticiaram o interesse de uma grande empresa estatal chinesa, Huluinbuir State Farm, de “compra ou aluguel de terras no Brasil que estejam disponíveis e aptas para o plantio de milho e soja”.

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