Num podcast há cerca de cinco meses, o gestor de fundos Daniel Goldberg cunhou uma das frases que melhor sintetiza a insegurança jurídica vivida no país hoje. “Nos últimos cinco anos, as leis melhoraram muito e os juízes pioraram bastante.” Ele não se referia à guerra de Alexandre de Moraes contra Elon Musk, embora ela tenha escalado desde então e reforçado a impressão de que juízes são mais importantes do que as leis por aqui. Por juízes, leia-se ministros do STF, do STJ e do TCU, diretores das agências reguladoras, assim como os integrantes da AGU e ainda os conselheiros da CVM e do Cade. O homem mais rico do mundo, que lida com apenas um ministro supremo, já alertou o mercado semanas atrás: “Investir no Brasil sob a administração atual é insano.” Por administração atual, leia-se toda a casta de burocratas instaladas no topo do poder.
Na sexta-feira 27, registrei neste blog como um dos diretores da Aneel conseguiu bloquear, ignorando uma decisão judicial, a transferência do controle da Amazonas Energia para a Âmbar, do grupo J&F. Ironicamente, o mesmo grupo, comandado pelos irmãos Batista, trava há seis anos uma disputa judicial com a Paper Excellence pelo controle da Eldorado Celulose, um negócio de 15 bilhões. No último capítulo da série, uma polêmica decisão do TRF-4 suspendeu, até julgamento final de uma ação popular, o tribunal de arbitragem que vinha dando ganho de causa ao grupo indonésio. A também polêmica ação popular questiona a venda da Eldorado sob o argumento de que o negócio, por envolver grandes extensões de terra onde são cultivados eucaliptos, deveria ter sido previamente autorizada pelo Congresso com parecer do Incra.
Outro caso memorável é o do acordo negociado pelas empresas Samarco, Vale e BHP sobre a tragédia ocorrida em Mariana, em 2015. Quase dez anos depois, as companhias já destinaram R$ 37 bilhões em reparações e ainda são pressionadas pelo MPF, pelo Judiciário e o governo a desembolsarem mais R$ 100 bilhões em dinheiro novo e mais R$ 30 bilhões em obrigações. Trata-se do maior processo reparatório da história do planeta, mas não para por aí.
Um outro processo sobre o mesmo caso vem sendo gestado paralelamente, em Londres, pelo escritório Pogust Goodhead, que cobra uma indenização de R$ 230 bilhões. Em evento recente, um dos sócios da banca chegou a dizer que atuava em nome de Lula e já conta com parceiros conhecidos no Brasil, pisoteando a claudicante soberania jurídica brasileira. O Instituto Brasileiro de Mineração (Ibram) teve de recorrer ao Supremo, que deve analisar o imbróglio até o fim do ano.
No campo da mineração, cito ainda um caso menor, mas não menos emblemático. Na Serra do Curral, em Belo Horizonte, a empresa Empabra tenta fechar uma mina e proceder seu descomissionamento, acordado com a Agência Nacional de Mineração. Mas o Ministério Público bloqueia o processo sob a alegação de que a atividade minerária está proibida no local, o que inviabiliza a retirada dos rejeitos e aumenta consideravelmente o risco de um acidente. Os promotores ainda cobram indenização de R$ 100 milhões.
O que dizer da disputa entre CSN e Ternium pela Usiminas? Desde que a empresa do grupo Techint adquiriu as participações da Votorantim e da Camargo Corrêa, o grupo de Benjamin Steinbruch questiona judicial e administrativamente o negócio. Após derrotas no Cade, na CVM e em três instâncias, um mero recurso à Terceira Turma do STJ causou uma reviravolta no cenário, impondo uma multa de R$ 5 bilhões à Ternium e o pagamento de R$ 500 milhões aos escritórios que representam a CSN — um deles chegou a contratar o filho de um dos ministros do STJ.
Recentemente, Alexandre de Moraes culpou as empresas pela insegurança jurídica no país, ao ingressarem com “milhões de processos que já sabem que vão perder”. Para o inimigo público número 1 do X, “a grande culpa do Judiciário é não penalizar as partes que atuam com mentalidade litigante”. “Por ser fácil e barato acessar a Justiça, quando o volume de dinheiro é muito grande, as partes vão entrando com recurso e protelando”, disse. Segundo ele, um caminho para resolver o problema é aplicar multas mais pesadas para a litigância de má-fé. Talvez o Estado brasileiro mereça ser processado pelo mesmo motivo.
Respostas de 2
A diferença de entendimento jurídico, entre o momento que encarceramos o Atual presidente, por gloriosos 580 dias e o atual, é impressionante, e o fim da prisão em segunda instância nossa maior derrota. Que viés maldito estamos.
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