O governo Lula anunciou um acordo final sobre o valor da indenização pelo desastre da barragem de Mariana. Serão R$ 167 bilhões, dos quais R$ 30 bilhões são obrigações de obras já iniciadas e outros R$ 37 bilhões foram desembolsados nos últimos anos em reparações e na reconstrução de distritos destruídos pela lama. Na prática, a Samarco e suas acionistas, Vale e BHP, se comprometeram a pagar mais R$ 100 bilhões em recursos novos à União e aos estados de Minas Gerais e Espírito Santo, incluindo seus municípios.
Resta a assinatura presidencial para sacramentar.
Lula precisa colocar logo um ponto final na questão, considerando que o caso se arrasta há quase uma década, e nesta segunda-feira 21, a Justiça britânica inicia o julgamento de uma polêmica ação coletiva movida pelo escritório Pogust Goodhead contra as mineradoras. A banca inglesa quer arrancar das companhias algo em torno de R$ 267 bilhões e não poupa esforços – alguns bem questionáveis – em sua ofensiva jurídica.
No lance mais recente, o sócio Tom Goodhead se reuniu dias atrás com representantes das vítimas no Brasil para convencê-los a não assinarem qualquer acordo negociado pelo governo. Chegou a alardear que a BHP estaria disposta a encerrar o litígio em Londres rapidamente por meio de um acordo com a Justiça britânica, e que pagamentos sairiam até o Natal, o que não passa de conversa fiada.
Em comunicado, a mineradora desmentiu o advogado e afirmou que está “participando ativamente das negociações com a Vale, a Samarco e as autoridades públicas no Brasil e está focada em chegar a um acordo no país”. “A BHP acredita que as vias para pagamentos de indenização às pessoas atingidas são mais rápidas e fáceis no Brasil, garantindo que o dinheiro permaneça no país”, diz.
Como já alertei antes, a atuação da Pogust Goodhead viola a soberania jurídica brasileira ao ignorar as tratativas oficiais sobre o caso, sob a alegação falaciosa de que as vítimas não foram contempladas no processo. O escritório diz defender 620 mil vítimas, além de 46 prefeituras, mas a captação desses clientes está envolta em suspeitas de irregularidades.
Flávio Dino, na semana passada, concedeu liminar em ação do Instituto Brasileiro de Mineração (Ibram), impondo restrições a municípios que firmaram contratos para litigar em tribunais fora do Brasil. O ministro determinou que as Prefeituras apresentem os contratos firmados e se abstenham de efetuar pagamentos de honorários vinculados a cláusulas de êxito, sem a autorização do Supremo ou de outras instâncias do Estado brasileiro.
Segundo o Ibram, “tais contratações expõem o Erário e as vítimas dos desastres socioambientais a imenso risco de lesão econômica, devido ao fato da cláusula ad exitum, pactuada em tais acordos, tornar os próprios escritórios de advocacia os grandes beneficiários de eventual reparação”. Conforme entrevistas e reportagens já publicadas na imprensa brasileira, a Pogust Goodhead costuma embolsar cerca de 30% do valor das causas em honorários, pois precisa remunerar seus investidores, normalmente fundos abutres.
O caso de Mariana não é o único. A PG também tenta usar a mesma estratégia nos desastres de Brumadinho, da mina de sal da Braskem em Alagoas e até na contaminação por alumínio das comunidades de Barcarena e Abaetetuba, no Pará. Trata-se de um negócio de enorme potencial lucrativo, especialmente em países com baixa governança e segurança jurídica.